Sabe aquelas mensagens de bom dia que você recebe todos os dias nos grupos da família? Há empresas e profissionais por trás da produção, que desperta até interesse internacional.
"Bom dia. Tudo é maravilhoso quando temos pessoas especiais por
perto!", diz a mensagem escrita sobre um fundo rosa, envolvida em folhas
e flores.
Por trás dessa despretensiosa imagem, que você poderia muito bem receber em qualquer grupo familiar no WhatsApp, está um mercado de empresas de comunicação e profissionais liberais que disputam cada clique dos brasileiros.
Baiano de Salvador, o empresário Ricardo Oliveira comanda uma rede de
sites que alcança milhares de pessoas diariamente — o número exato nem
ele mesmo sabe.
A produção, porém, é intensa.
Junto a Oliveira, outras sete pessoas (uma sócia, três funcionários e
três freelancers) estão envolvidas na concepção, produção e publicação
dos desejos de "bom dia", "boa noite", recados de otimismo, legendas
prontas e mensagens religiosas em cinco dos sites mais bem ranqueados no
Google — ou seja, aqueles que aparecem primeiro quando buscamos
palavras como "mensagens de bom dia".
Por dia, são publicadas mais de 10 imagens e 20 frases de efeito — que
internautas, ao visitarem os sites, podem copiar ou linkar direto para
uma conta de WhatsApp com um clique.
O resultado é que nos cinco sites — Mensagens de Bom Dia, Mensagens de
Reflexão, Frases de Aniversário, Frases para Whats e Frases para Insta —
o número de visitantes mensais varia de 900 mil a 3 milhões por mês, em
cada um.
Empresas faturam com anúncios online |
E é justamente esse volume que faz o negócio ser rentável: os anúncios
colocados nos espaços publicitários dos sites são praticamente a única
fonte de renda da empresa.
"Estando no meio digital, estamos mais propícios a sermos desatentos. E
as empresas que fazem propagandas, com os anúncios na internet, se
aproveitam dessa distração para nos vender as coisas", explica Maria
Augusta Ribeiro, especialista em netnografia (o estudo do comportamento
em redes sociais), sobre essa já popular estratégia de negócios.
Quando surgiu, há quase 12 anos, a empresa de Oliveira faturava em cima
de anúncios, mas produzindo conteúdo para blogs. Há sete, mudou o foco e
passou a produzir mensagens que pudessem ser compartilhadas
principalmente no Facebook. Hoje, é o WhatsApp que dá as cartas na mesa.
"A minha vida melhorou muito graças à internet e aos negócios que pude
criar a partir dela", diz o empresário, que nasceu e cresceu no Subúrbio
Ferroviário, na periferia da Grande Salvador, sem revelar o
faturamento.
Além das empresas de pequeno porte e de profissionais em Estados como
São Paulo e Paraná, a BBC News Brasil identificou também grandes
agências de comunicação que, entre os produtos, também produzem
conteúdos para sites de mensagens e reflexão. O mais famoso deles é o
Pensador, tocado por uma companhia de Portugal.
O site Megafrases é comandado pela aposentada Eliete de Araujo |
Diversão na aposentadoria
Uma vez nos grupos de WhatsApp, é impossível saber o alcance de determinado conteúdo.
Mas os criadores de conteúdo contam que não é raro algum contato
enviar, sem saber, uma mensagem que eles próprios haviam produzido.
"Em épocas de festas, acontece mais, de uma tia minha mandar uma
mensagem dando bom dia. Eu brinco perguntando se elas sabem que estão
mandando pra mim o que eu mesmo produzi", conta Ricardo.
O mesmo já aconteceu com a aposentada Eliete de Araujo, fundadora do site Megafrases.
Há um ano, ela pediu ajuda ao filho para colocar em prática um "hobby" e
"levar alegria" às amigas do condomínio, no Rio de Janeiro.
"Sempre gostei desse tipo de mensagem, mas tinha uns sites que eu não
gostava das imagens", explica Eliete, que hoje já complementa a renda e
paga uma colaboradora com o dinheiro de anúncios no site. E isso porque o
Megafrases é considerado ainda um site de pequeno porte, com média de
100 mil visitantes mensais.
"Fico impressionada com o poder da internet. Hoje, me realizo ao me sentir útil depois da minha aposentadoria".
O alcance das mensagens positivas
Se há a percepção de que mulheres mais velhas compartilham mais esse
tipo conteúdo, os dados de acesso mostram que são as mulheres de 25 a 35
anos que mais procuram as mensagens.
"São elas que buscam, que sabem chegar no conteúdo. Mas uma vez no
WhatsApp, as mais velhas gostam mais de compartilhar", diz Ricardo
Oliveira.
Para cálculo interno, ele projeta que, a cada 20 pessoas que visitam o
site, uma baixa as imagens. E elas espalharam, em média, a dez pessoas,
cada, no WhatsApp.
Ou seja, num site com visita mensal de 5 milhões de pessoas, as artes da empresa alcançariam 250 mil brasileiros.
Mensagens se espalham em aplicativo de mensagens |
Maria Augusta Ribeiro, que desenvolve trabalhos para marcas sobre
comportamento digital na empresa Belicosa, destaca que, neste período de
pandemia, mensagens de otimismo vêm viralizando ainda mais, com
assuntos que vão da saúde mental ao amor.
"Se eu sorri pra você pessoalmente, imediatamente você sorri de volta. E
esse é o gatilho mais simples para entender o digital. O meio se
aproveita disso, dessas ligações de amor, para nos engajar".
Mas nem tudo são flores: com a crise econômica, menos dinheiro sobra
para anúncios online. Na empresa baiana, houve um baque de 70% nos
últimos 6 meses — mas não por causa da audiência (que cresceu), mas
justamente por menor quantidade de anúncios "caros". No caso de Eliete,
houve mais de 50% de queda no faturamento.
Interesse internacional
A paixão por brasileiros por esse tipo de mensagens já cruzou as fronteiras.
O norte-americano Christopher Bourgault, dono de uma empresa baseada em
Los Angeles, nos Estados Unidos, adquiriu em março um dos sites mais
bem ranqueados no Google sobre mensagens de "bom dia" e "amor" em
português: o Amplino.org.
O que lhe chamara a atenção foi o alto número de visitas no site.
"Vimos uma oportunidade diante de um site com conteúdo inspirador,
otimista, principalmente nos tempos turbulentos de pandemia. Parecia uma
aquisição fantástica. Não é sempre que temos a oportunidade de, ao
mesmo tempo, ganhar dinheiro e ajudar a criar uma mudança positiva no
mundo".
Bourgault não revelou os valores da transição com o brasileiro que
havia criado o site junto com a filha e o colocou para vender.
Além do Amplino (o único em português), a empresa dos EUA conta com
outros sites de produção de conteúdo. São mais de 10 colaboradores ao
redor do mundo.
Sem revelar também os números de audiência, o norte-americano diz
apenas que, com aquisição do site, se "familiarizou" com a grande
popularidade do WhatsApp e desse tipo de mensagem no Brasil.